Agro, responsável por 50% das exportações, enfrenta crise
O agro nacional tem um papel fundamental na economia brasileira, representando cerca de 50% das exportações do país e movimentando US$ 166 bilhões em 2024. Além disso, esse setor gera aproximadamente 20 milhões de empregos diretos e indiretos e contribui com 25% a 30% do PIB, considerando toda a cadeia produtiva, que envolve logística, processamento e comercialização.
O Brasil se destaca no cenário mundial como líder e vice-líder na exportação de diversos produtos, como soja, milho, café, carne bovina, suína e frango. A soja, em especial, se tornou uma cultura presente em todos os estados, sendo uma verdadeira marca do nosso agronegócio.
Porém, é importante ressaltar que o setor enfrenta alguns desafios nos últimos anos. A queda nos preços das commodities, o aumento nos custos de produção e algumas notícias negativas relacionadas a empresas endividadas têm criado um clima tenso. Esses tópicos foram discutidos durante o debate “Separando o Joio do Trigo: O futuro do Agronegócio no Brasil”, realizado na última edição da experiência XP 2025.
Não há crise estrutural no agro, dizem analistas
Octaciano Neto, cofundador da Zera.ag, acredita que o agronegócio não está passando por uma crise estrutural, mas sim enfrentando momentos pontuais de estresse. “O Brasil evoluiu nos últimos 40 anos graças ao agro. Falar em crise no setor mais resiliente da economia não faz sentido”, afirma.
Ele destaca que o que existe é uma “crise simbólica”, gerada pela dificuldade de comunicação com o mercado financeiro e pela exposição excessiva de situações isoladas. Um exemplo disso é a recente queda no preço da soja, que passou de US$ 200 para US$ 100 — uma alteração natural nas commodities, que são conhecidas por sua volatilidade. Por outro lado, outras culturas como café, cacau e laranja alcançaram preços altos no começo de 2024.
Agro entra na era da governança e da gestão de risco
Octaciano aponta que, nos últimos 50 anos, o setor evoluiu em três áreas: biologia (sementes e genética), química (fertilizantes e defensivos) e mecanização. Agora, ele se prepara para entrar na quarta fase, que é a da governança e gestão de riscos. “É um campo novo para muitos produtores, mas que está evoluindo rapidamente. A capacidade de se comunicar com investidores se tornou essencial”, enfatiza.
Ele ressalta que para os gestores do mercado de capitais, é fundamental unir três competências: conhecimento técnico do agro, entendimento do mercado financeiro e habilidades de comunicação. Essa combinação é nova para muitos, mas é crucial para o sucesso no setor.
Alta dos juros trava investimento de longo prazo
Paulo Mesquita, Head de Agribusiness da Riza Asset, explica que os juros elevados têm dificultado novos investimentos no agronegócio, especialmente os que visam retornos a longo prazo, como abertura de novas áreas ou aquisição de maquinário e infraestrutura. “Com a Selic em torno de 15% ao ano, esses projetos se tornam inviáveis. A situação dos balanços de 2024 mostra que muitos produtores estão sobrecarregados de dívidas, afastando investidores”, revela.
Por sua vez, Gustavo Gomes, da XP Asset, afirma que os casos de recuperação judicial que têm sido divulgados não representam a totalidade do setor. Eles envolvem apenas alguns produtores com alta alavancagem. “O investidor precisa analisar os números, não se deixar levar apenas pelo que aparece na mídia”, alerta.
Diversificação regional reduz riscos no agro
Octaciano defende a diversificação regional e de culturas como um dos principais trunfos do agro brasileiro. Ele comenta que, enquanto o milho se concentra em 6 a 8 estados, a cana em 3 ou 4 e o cacau em 2, a soja é a única cultura que realmente abrange todo o país. Isso ajuda a minimizar riscos relacionados a clima, sanidade e comercialização.
“O foco é diversificar as culturas. No Brasil, ao fazer isso, você também está reduzindo todos os riscos possíveis”, explica. Paulo Mesquita complementa que, com boas garantias e um histórico sólido, é possível formar operações seguras para o investidor. “Produtores com 30, 40 ou 50 anos de experiência já enfrentaram várias crises. Eles costumam ser os parceiros mais confiáveis para alocar capital com segurança”, conclui.
Nova fase do Fiagro e regulamentação
O Fiagro (Fundo de Investimento nas Cadeias Agroindustriais) tem se tornado uma ferramenta importante para financiar o agronegócio. Segundo Octaciano, menos de 3% dos recursos do Plano Safra são de origem pública. A maior parte do financiamento vem de fontes privadas, apoiadas por instrumentos como a LCA (Letra de Crédito do Agronegócio) e incentivos fiscais.
Com a nova regulamentação da CVM, os Fiagros podem expandir seu alcance, indo além dos CRAs (Certificados de Recebíveis do Agronegócio) e adotando estruturas como FIDC e fundos híbridos, que integram créditos e participação em terras agrícolas.
“Estamos assistindo ao surgimento de uma nova fase. O Fiagro pode se transformar em um verdadeiro hedge fund do agro, investindo até em ações de empresas do setor”, destaca Octaciano.